Por que o marketing conflita com outras áreas da empresa?
*Por Al Ries
“Porque nós temos problemas em vender nossas idéias para a cúpula da empresa?” Eu fiz recentemente essa pergunta à minha sócia e filha, Laura.
“Pai”, ela respondeu, “eles não são como nós. Eles são lado-esquerdo do cérebro.”
E isso resulta no maior problema dos negócios de hoje: a administração do lado-esquerdo e o marketing do lado-direito não se olham olho-no-olho. Administração é verbal, lógica e analítica. Marketing é visual, intuitivo e holístico.
Os lado-esquerdo geralmente são bons oradores. Lado-direito geralmente são bons escritores. O marketing pensa visualmente. Claro que eles negociam em palavras, já que o objetivo final do marketing é gravar uma palavra na mente. Mas eles querem palavras simples que possam ser facilmente visualizadas.
Por exemplo, a Boston Chicken mudou seu nome para Boston Market e isso foi um grande erro. Você pode visualizar um restaurante de grelhados, mas como você visualiza “mercado”?
Foco no café
Outro case interessante: Vários anos atrás, Starbucks chamou um guru pra ajudar os gestores a definir um objetivo único. O resultado: “Ser uma das mais conhecidas e respeitadas empresas no mundo por cultivar e inspirar o espírito humano”.
Quando Howard Schultz retornou ao comando da Starbucks, ele imediatamente se focou no café. “Starbucks volta ao grão”, dizia um título do jornal USA Today. “Nós derramamos mais café do que a maioria das cafeterias vendem”, disse Schultz naquele artigo.
Gestores falam sobre cultivar e inspirar pessoas. Empreendedores falam sobre café.
A maioria dos empreendedores como Howard Schultz, Steve Jobs, Jeff Bezos e Michael Dell são lado-direito do cérebro. Entretanto, quando empreendedores amadurecem, geralmente eles entram no modo gestão e deixam o lado-esquerdo assumir o comando.
Pensamento lógico e analítico ajudam a gerar confiância que a habilidade de enxergar longe exige. Afinal, se você estudou uma situação nos mínimos detalhes, então você está preparado para prever o que vem a seguir.
Gestão lida com fatos e gráficos, tem uma visão analítica do problema. Resumidamente, gestão lida com realidade. Marketing, no entanto, lida com percepção. O que importa para o marketing não é apenas o chamado fato, mas o que está na cabeça do consumidor.
Aposte na percepção
Ano passado, a Hyundai lançou um carro de US$40.000, o Genesis. “Tudo que estamos fazendo é trazendo a verdade para as pessoas — a qualidade, o valor residual e a tecnologia de segurança”, disse John Krafcik, VP de planejamento de produto.
Isso poderia ser verdade, mas a percepção é que aquele Hyundai é um carro barato. Então, quem vai vencer a batalha? Maioria dos profissionais de marketing apostariam na percepção.
O principal objetivo da gestão é expandir os negócios. Um das primeiras coisas que Robert Nardelli — da Home Depot — fez foi gastar US$6 bilhões para adquirir 25 atacadistas com objetivo de crescer nesse segmento. A Home Depot acabou vendendo tempos depois.
O principal objetivo do marketing é afinar o foco. Você não constrói uma marca se não consegue ter uma coisa em mente. Frequentemente, o melhor caminho é isolar um serviço que você domina ou um atributo que você tem. Esse é o motivo pelo qual a FedEx se focou na entrega noturna. O que aconteceria se a FedEx tivesse contratado um “cortador-de-custos” como seu CEO?
Gestão é quase totalmente focado na execução. Como Larry Bossidy e Ram Charam escreveram em seu livro: “Tanto esforço de pensamento tem ido para a estratégia que não é mais um desafio intelectual. Você pode contratar a estratégia que quiser de uma consultoria”.
IBM x Dell
Ninguém executa melhor que a IBM. Ainda que o IBM PC tenha sido um fracasso, tendo gerado um prejuízo de $15 bilhões em 23 anos.
O nome foi um erro. IBM tinha uma percepção de mainframe, não de computador pessoal. E qual era a estratégia de marketing? Alguém sabe?
Compare IBM com Dell, uma empresa formada em 1984 num quarto de faculdade por um estudante do 2° ano da Universidade do Texas. Desde então, Dell fez $25 bilhões.
Dell tinha um nome melhor e uma estratégia melhor. A Dell focou-se na venda de computadores pessoais para empresas, permitindo que os consumidores montassem o seu de acordo com sua necessidade. Agora que gestores lado-esquerdo assumiram, a Dell tem ido morro abaixo.
O senso-comum é o abismo entre o lógico e analítíco lado-esquerdo da gestão e o intuitivo e holístico lado-direito do marketing.
“Marketing leva um dia pra se aprender”, disse Kotler, “mas uma vida pra se tornar mestre”.
Aparentemente, gestão é muito mais fácil de se tornar mestre. “Eu descobri que gestão não é algo difícil na teoria”, escreveu o guru Charles Handy. “Sua dificuldade está na aplicação de idéias, não nas idéias em si”.
Idéias de marketing, por outro lado, são difíceis de conceber porque elas contradizem o senso-comum — já que elas lidam com percepções humanas que estão sempre mudando e isso é uma tarefa dificílima. Pergunte a um psicólogo.
Então, a batalha está perdida? Na verdade não. Mas o profissional de marketing tem que vender uma idéia na linguagem da gestão, não na linguagem do marketing.
Esqueça as apresentações bonitinhas, use ferramentas analíticas para vender conceitos holísticos. Use fatos, gráficos, market share e outros dados para vender idéias intuitivas a pensadores lógicos.
E não venda apenas um conceito; venda uma analogia. “Nós devemos fazer o que Grey Goose fez — lançar uma marca de ponta”. Ou “Nós devemos fazer o que a Apple fez — lançar uma segunda marca como o iPod”.
*Al Ries é um dos mais conhecidos consultores e escritores de marketing de todos os tempos. Autor do livro Posicionamento — A Batalha pela Sua Mente, considerado o livro mais importante sobre o tema e que vendeu mais de 1 milhão de cópias.
< Publicado originalmente na Advertising Age e traduzido pelo Sylvio R, do Pequeno Guru >